16 de maio de 2010 | N° 16337

ARTIGOS

Tu(r)ma do Dunga, por Flávio Tavares*

A aparente confusão do título não é culpa minha, nem há nela qualquer intenção burlesca. A ideia é do presidente da República e só acrescento um “r”, entre parêntesis, para alongar a percepção. Foi ele quem se confundiu ao defender os nomes convocados à seleção de futebol e, traído pelo inconsciente, trocou Dunga por Tuma. No divã do psicanalista, como se fosse berço esplêndido, ficamos nós, 160 milhões de brasileiros.

Nessa triste história das intimidades do todo-poderoso secretário nacional de Justiça, Romeu Tuma Júnior, com a máfia chinesa de São Paulo, só temos a aprender com o futebol.

Como reagiríamos se Ronaldinho Gaúcho, excluído da lista do Mundial, dissesse ao Dunga que continuaria na Seleção? E que, se não lhe dessem uniforme, jogaria com a camiseta guardada nas gavetas da sua casa em Milão ou Porto Alegre? Nosso Ronaldinho, porém, é educado. Pode irritar-se em campo quando lhe puxam a camisa ou enfiam os pés em coices pelos tornozelos para impedir o balé de mestre com que nos delicia, mas nunca foi arrogante. Sua hábil maestria está também na humildade.

É o oposto de Tuma Júnior.

De onde vem ou onde nasce o poder arrogante do atual secretário nacional de Justiça, negando-se a deixar o cargo? Virá só de suas atribuições – repatriamento de dinheiro enviado ilegalmente ao Exterior, regularização de estrangeiros e controle das ONGs no país? A investigação da Polícia Federal não começou nele, mas nas atividades de Li Kwok Kuen, o chinês naturalizado brasileiro, monarca do contrabando e da pirataria, e seu antigo assessor parlamentar quando deputado estadual em São Paulo.

O próprio Tuma admite que o chinês era seu amigo. Aos jornais, contou que após a prisão de Li, meses atrás, indagou do então ministro da Justiça, Tarso Genro, se devia afastar-se do cargo. “Toca o pau”, respondeu-lhe o ministro, confirmando a confiança e mandando que continuasse.

Desde então, agigantou-se o poder desse delegado estadual de polícia no Ministério da Justiça.

Em maio de 1980, há 30 anos, seu pai, o delegado Romeu Tuma, chefe do Dops paulista, prendeu Lula da Silva e outros sindicalistas na greve operária do ABC. A sombra do delegado-torturador Sérgio Fleury pairava ainda sobre a temível polícia política com uma diferença: vivia-se a “abertura redemocratizadora” do general Figueiredo, os tempos começavam a mudar e Tuma era “durão”, mas afável e educado. Dias depois, permitiu que Lula deixasse o cárcere, escoltado mas sem algemas, e presenciasse por alguns minutos o velório da mãe, dona Eurídice.

Não é isso, porém, que explica a leniência de Lula-presidente. A gratidão é virtude, não defeito, mas é algo pessoal e individual, que não deve interferir no conjunto dos interesses do Estado nem transferir-se de pai para filho. Não pode cegar a quem a recebe nem exaltar a quem a concede.

O delegado do Dops que prendeu o sindicalista Lula, porém, hoje é senador, manda no PTB paulista e integra a base aliada do governo Lula. A sucessão presidencial está aí e o partido de Tuma pai e Tuma filho não sabe se fica onde está ou se muda de lado. Tem, porém, alguns minutos de TV no horário eleitoral com que seremos assediados. E isso conta, mesmo que a repetição das velhas chorumelas embelezadas pelas agências de publicidade nos canse.

Na pequenez da nossa política, só conta a aparência. E nada tem mais visibilidade do que alguns minutos na TV. Que o digam Dunga e sua turma.